As práticas restaurativas no contexto da pandemia do Coronavírus: um estudo de caso na Escola Estadual Professor José Ribamar Pestana, em Santana – AP

Prácticas restaurativas en el contexto de la pandemia del Coronavirus: un estudio de caso en la Escuela Estatal Profesor José Ribamar Pestana, en Santana – AP

Restorative practices in the context of the coronavirus pandemic: a case study in the José Ribamar Pestana School in Santana – AP

Tembiapo ñemoatyrôgui mba'asypa jave, ojehecha mba'épa oiko mbo'ehao mbo'ehára José Rivamar Pestana, em Santana – AP pe

 

Maria de Jesus Pedreira Ferreira, Girlene Bacelar Lima
y Andrea Carla Carvalho da Silva

 

Nota de las autoras

 Secretaria Estadual de Educação do Estado do Amapá

 [email protected].

 

 Resumo

Este estudo surgiu do desejo de registar as vivências educacionais de uma escola pública em meio a pandemia do Coronavírus (COVID-19) entre os anos de 2020 e 2021. Seis olhares se cruzaram entre o morrer provocado por um poderoso vírus invisível a olho nu e o sobreviver da escola por meios do pensar e agir restaurativos num recorte das experiências em Práticas Restaurativas da Escola Professor José Ribamar Pestana no município de Santana no Amapá numa perspectiva de construção de novas possibilidades da escola hoje. Para tanto, utilizou-se duas categorias: professores com conhecimentos sistemáticos e alunos com suas realidades pessoais, ambas transformadas durante o isolamento social. Como método, desenvolveu-se pesquisa bibliográfica e documental em livros e artigos científicos de autores voltados à Educação. Os resultados mostraram as (re)estruturações e (res)significações passadas pelos dois grupos pesquisados, ressaltando-se a necessidade de se ampliar a discussão dessa temática junto a escola após a pandemia.

Palavras-chave: alunos, professores, escola, pandemia do coronavírus, práticas restaurativas

Resumen

Este estudio surge del deseo de registrar las experiencias educativas de una escuela pública en medio de la pandemia del Coronavirus (COVID-19) entre los años 2020 y 2021. Seis miradas se cruzan entre el morir a causa de un poderoso virus invisible a simple vista y el sobrivivir de la escuela a través del pensamiento y el actuar restaurativo en un recorte de las experiencias en Prácticas Restaurativas de la Escuela Profesor José Ribamar Pestana del municipio de Santana en Amapá en una perspectiva de construcción de nuevas posibilidades para la escuela hoy. Para ello, se utilizaron dos categorías: docentes con saberes sistemáticos y estudiantes con sus realidades personales, ambas transformadas durante el aislamiento social. Como método se realizó una investigación bibliográfica y documental en libros y artículos científicos de autores enfocados a la Educación. Los resultados mostraron las (re)estructuraciones y (re)significaciones atravesadas por los dos grupos encuestados, destacando la necesidad de ampliar la discusión de este tema con la escuela después de la pandemia.

Palabras clave: estudiantes, docentes, escuela, pandemia de coronavirus, prácticas restaurativas

Abstract

This study born from the wish of registrate the educationals viviencies of a school in the middle of the pandemic Coronavirus (COVID-19) in between the years 2020 and 2021. Six visions came across in between the death caused of a powerful and deadly invisible virus and the survival of a school by the think and act restoratives in a side view of the experiences in Restorative practices in the José Ribamar Pestana School in Santana town – estate of Amapá in a constructions of perspectives of new possibilities from the school today. This study developed from bibliographic researchers and documental in books and scientific articles of educacional authors. The results show the (re)instructions and (re)significations in hand of both groups studied reassuring the growth necessity of the discussion of this theme in a school after the pandemic.

Keywords: students, teachers, school, pandemic, restaurative practices

Ñemombykypyre

Ko jesareko heñói ñemboguapységui tekombo'e ikuaapy peteī tetã mbo'ehópe pe tasypa COVID-19 ary 2020 ha 2021 aja ojehecha poteī haicha pe oñemano mba'asy mbarete ojehecha'ỹva tesápegui ha pe oikovére mbo'ehao ojehekápe ha oñepyta'ãme môatýróreko mba'apo rakykuerére omopyendáva moatýrôkatu mbo'ehao, mbo'ehára José Ribamar Pestana oīva táva Santana omapápe oikehápe tembiapo ombopyahúvo mbo'ehao katu ağa upevãra ojeiporu mokôi hendapy, mbo’ehára hembikuaa ñemboysýipýva ha temimbo’e hekombo'e haicha å mokôi hendápe oñemoambue ko mba'asypa aja ñanêmoha'eñóva

Mba’e mba’e rehepa oñeñe’ẽ: Temimbo'e mbo'ehára mbo'ehao mba'asypa tembiapo ñemoatyrôgui

 

Fecha de recepción: 30/11/21

Fecha de aprobación: 30/11/21


Introdução

A Educação brasileira tem vivido grandes desafios ao longo dos tempos, bem vistos quando contextualizada histórica e politicamente. Compreender as consequências é analisar os rumos que lhe foram dados, como, por exemplo, nestes quase dois anos de pandemia do Coronavírus (Covid-19) iniciada no mundo no final de 2019 e alastrada no Brasil a partir de março de 2020, trazendo à tona a grande desigualdade humana visivelmente nas camadas populares mais pobres e vulneráveis.

Pretendendo apreender as questões pertinentes da educação pública durante a pandemia, este estudo teve por objetivo provocar reflexões do modo como a escola trabalhou impactos de aspectos sócio emocionais durante o isolamento social, no período dos anos de 2020 e 2021. Para alcançar tal objetivo, tomou-se como objeto de estudo, sujeitos, como os professores e os alunos, e como base desenvolveu-se pesquisa bibliográfica e documental com livros e artigos científicos de autores voltados à Educação, fazendo-se uma relação viva com as observações e os relatos dos dois grupos estudados.

Deste modo, este estudo referiu-se a alguns autores como: Belinda Hopkins (2004), Kay Pranis (2015) e Paulo Freire (1991), que muito mantém-se relacionados e envolvidos quanto a questão escola como comunidade restaurativa. O que fez desses três autores, relação em comum com as questões norteadoras sobre sentimento de amorosidade quando veem na escola um sentido de pertencimento e alegria de todos que dela fazem parte.

Dentro deste contexto, destacou certas deliberações que a escola adotou em relação ao diálogo durante a quarentena da Covid-19, uma vez que, a situação pandêmica no mundo passou a interferir em todos os aspectos da vida do ser humano, principalmente e fundamentalmente em hábitos e costumes, fazendo-se necessário que a escola repensasse sua rotina diária, já que tudo, que acontecia na sociedade se repercutia em seu interior.

Existindo várias perspectivas de o homem interferir no mundo, para ser o fazedor de sua história, como diz Freire (1983), este estudo apontou para o campo educacional, especificamente no contexto escolar no decorrer da pandemia de Covid-19, propondo uma mudança da cultura vigente para uma cultura de bem-estar e de paz para todos que fazem parte dela. Como ressalta Pranis, “construir uma comunidade escolar restaurativa”, onde se nutre bons relacionamentos entre todos e os conflitos sejam resolvidos por meio de diálogos e não mais de forma punitiva como se aplicava antes.

Nesta ótica, este estudo abordou os processos circulares como ferramenta proposta pela Justiça Restaurativa, utilizada no Estado do Amapá desde 2010, e sendo em 2014, instituída em Santana pela Promotoria de Justiça, a qual criou o Núcleo de Mediação, Conciliação e Práticas Restaurativas.

Em 2015, a Justiça Restaurativa ampliou a proposta às escolas de Santana, com objetivo de melhorar as relações interpessoais e mediar conflitos e violências em seu interior por meios das Práticas Restaurativas.

Necessário se faz considerar a distinção entre Justiça Restaurativa e Práticas Restaurativas. Segundo Scuro Neto (1999), a Justiça Restaurativa é “a possibilidade de transformar o processo da resolução de problemas em instrumento preventivo de violência e criminalidade, reduzindo o índice de futuras infrações, em especial quando os envolvidos são menores de idade” (Scuro Neto, 1999), sendo esta aplicada ao Sistema de Justiça Criminal. As Práticas Restaurativas são processos informais construídos para prevenir atos de violências, aplicadas em espaços como escola e comunidade.

Em 2016, a Escola Estadual Professor José Ribamar Pestana em parceria com o Ministério Público, realizou seu o primeiro plantão pedagógico, através da metodologia das práticas restaurativas, utilizando como ferramenta os Círculos de Diálogos com os pais e responsáveis dos alunos, abordando o tema “Família e Escola, uma parceria que dá certa”.

A organização do planejamento das práticas restaurativas na Escola Pestana ocorreu de fato em 2017 e efetivada como Núcleo de Práticas Restaurativas em 2018, composto por funcionárias certificadas como Facilitadoras de Práticas Restaurativas na Educação, empregando de forma prática as diversas “ferramentas facilitadoras” como apoio aos professores e alunos em diferentes assuntos.

No biênio 2020/2021, as aplicações dos princípios restaurativos no contexto escolar foram adaptadas em decorrência da pandemia do Coronavírus (Covid-19), utilizando-se metodologias específicas para aquele momento, como: os Processos Circulares e a Escuta empática, fazendo com que a distância não interferisse nessa relação e nem o vínculo com a escola se perdesse e esvaísse naquele momento de distanciamento entre todos.

O propósito do presente artigo esteve longe de trazer conclusões definitivas sobre os impactos da pandemia, buscou-se discutir seus reflexos, além do cenário em que ocorreu e os tipos de consequências desenvolvidas nos grupos pesquisados, revelando princípios restaurativos e valores como meios de amenizá-los e tecendo ao final, considerações críticas sobre a escolha do tema, apontando para possíveis debates e desafios da escola.


Metodologia

Este estudo foi realizado na Escola Estadual Professor José Ribamar Pestana, no município de Santana, no Amapá, entre os anos de 2020 e 2021. A proposta se utilizou de estudos de autores: Belinda Hopkins, Carolyn Watson e Kay Pranis como referências norteadoras da prática dos Círculos nas escolas, e de Paulo Freire, por sua aproximação amorosa com a escola como ambiente alegre para a construção do conhecimento.

É importante ressaltar a relevância do estudo realizado no contexto da pandemia e estabelecer relações com os autores que embasaram esta pesquisa, tendo destaque especifico nesse estudo às contribuições da metodologia de práticas restaurativas utilizadas nas vivências e observações durante o período em questão.

Neste sentido, esta pesquisa se deteve a algumas ferramentas que fazem parte da metodologia de práticas restaurativas, dentre elas os processos circulares utilizados desde o ano de 2016 na Escola Ribamar Pestana fixando suas aplicabilidades no Calendário Escolar de cada ano letivo, tanto em plantões pedagógicos, em planejamentos com professores e no dia a dia com estudantes. Os processos circulares eram usados de acordo com a situação e momento como procedimento restaurativo. Sendo os Círculos de Construção de Paz, mais utilizados com os alunos para explorar determinada questão ou assunto a partir de vários pontos de vista.

No processo de relevância e identificação com os ensinamentos de Hopkins e Pranis, os quais fizeram de bases para a utilização dos Círculos de maneira regular e rotineira pela escola, este estudo chamou a atenção para os elementos essenciais característicos do Círculo, onde incluem-se: Sentar em Círculo, sendo de suma importância para que os participantes se enxerguem; seguido do Momento de Meditação feito brevemente para conectar os participantes. Geralmente se trabalha a respiração com um agradável som ao fundo; o Acolhimento dando as boas-vindas a todos e agradecendo a presença; a Peça de centro que é um pano ou tapete circular onde estão itens expostos no chão para os participantes escolherem e falarem o motivo pelo qual estão ali. Comumente, usam-se objetos, fotos, palavras identificando os valores para o momento.

Há o Facilitador que é a pessoa que conduz as etapas, estimula a reflexão e envolve os participantes a falarem e a ouvirem uns aos outros; o Objeto ou Peça de Fala, escolhido previamente que dá o poder de fala a quem está segurando sem ser interrompido pelos demais; o objeto é passado de pessoa para pessoa, não sendo obrigado a falar, podendo passar para a próxima, para facilitar o diálogo, o facilitador fala sem o objeto; a Construção dos Combinados, conversa com os participantes sobre alguns combinados para se sentirem bem e seguros durante o processo. Pede-se para falar na primeira pessoa, fala sucinta e objetiva, não falar sem o objeto de fala, celulares desligados, horário de encerramento, escutar ativamente; as Perguntas Restaurativas que são elaboradas para construir relacionamentos, explorar questões, e facilitar as discussões, os Acordos/Decisões que são as decisões feitas em consenso entre todos os participantes; e, o Encerramento, onde faz-se o agradecimento a todos pela participação no Círculo.

Na pandemia, esses elementos estruturais que compõem os Círculos foram adaptados para o formato on-line para atender aos professores, realizados da seguinte forma:

-     Antes do Círculo Virtual:

  1. Envio de convites nos grupos de WhatsApp da escola para participarem dos Círculos Virtuais. Contendo a data da realização, sob responsabilidade da equipe do Núcleo de Práticas Restaurativas da Escola Pestana.

-     No dia do Círculo Virtual:

  1. Cerimônia de abertura. Boas-vindas aos participantes.
  2. Tema com os Objetivos propostos para o momento.
  3. Combinados.
  4. Iniciava-se o Círculo com a Rodada de Check-In.
  5. Rodadas de Perguntas Restaurativas.
  6.  Check-Out / Finalização. Uma Rodada de Pergunta.
  7. Encerramento.

Para efeito do propósito do funcionamento do Círculo, segue de modo resumido um procedimento de Círculo de Diálogo realizado virtualmente com professores, em 2020.

O Círculo foi realizado com professores e pedagogos de cada turno usando o mesmo roteiro. As etapas do Roteiro foram divididas entre as Facilitadoras da equipe de Práticas Restaurativas. O Círculo tinha como objetivos: aprender com a pandemia e quais aprendizagens positivas foram tiradas como experiências. Dadas as boas-vindas a todos, justificando o momento que estavam distantes fisicamente, porém próximos na alegria, na comunicação e na conexão com a escola. Apresentava-se os Combinados:

-          Microfones desligados, ligar quando precisar falar;

-          Garantia da fala do colega;

-          Avisar, caso precisasse se ausentar antes do término do Círculo.

A mesma atenção dada aos professores foi pensada aos alunos que necessitavam de auxílio no aspecto sócio emocional, com impactos pela dor de suas perdas e de seu afastamento por um período tão prolongado, assim como seus medos, dúvidas e as incertezas em relação à vida e ao viver. Para essa categoria, a equipe do Núcleo de Práticas Restaurativas utilizou habilidades como a empatia, a resiliência, o respeito e o autocuidado para entender emoções e sentimentos.

De todas as habilidades, a Escuta ativa[1] foi a ferramenta facilitadora utilizada para a comunicação com alunos por meio de aparelhos celulares. Pode-se experimentar o efeito desta prática por meio do relato à professora numa situação vivida por uma aluna onde todos da família tiveram COVID-19, tanto os pais, como os seis filhos, sendo que os pais e uma das irmãs foram internados e a aluna, para não ser contaminada pela doença, foi enviada para a casa de uma tia, nisso a ansiedade, o medo tomou conta dessa aluna, aumentado ainda mais pelo falecimento de sua mãe. Após um mês dessa fatalidade, a família retomou a vida e a aluna continuava triste, saudosa e sem interesses pela vida.

Foram várias tentativas de fazer a escuta empática com a aluna e a resposta só veio após uma semana quando a professora ligou para ela para saber como estava e quase sem respostas. A professora usou de estratégia figuras que chamassem a atenção e estimulasse a menina a falar. Era o desenho de dois cachorrinhos postado pela professora e a partir desse momento a aluna começou a dialogar espontaneamente, descrevendo seu animal e dizer que estava com saudades dele.

Hopkins (2004), afirma que o processo de Escuta é delicado e gradual, requer ouvir com empatia, e sem julgamento. E como metodologia, recomenda que sejam adotadas perguntas restaurativas para que a pessoa se sinta respeitada, valorizada e ouvida. Perguntas como: O que aconteceu? O que você precisa para se sentir melhor em relação a isso? O que você pode fazer para que as coisas fiquem em ordem?

Um dos momentos mais significativos vivenciados por meio dos processos circulares, foi o Círculo de Celebração Natalina trazendo a Rodada de Construção de Valores com os participantes anunciando o valor que queria exercitar em 2021. Seguida, da pergunta restaurativa: O que aprendi de positivo neste ano de 2020.

Esse Círculo teve dois momentos: O 1º. Do “Amigo Valoroso”, onde o participante de posse de um nome de uma pessoa tirada secretamente completaria a frase: O que eu valorizo no/a meu/minha amigo/a. O 2º momento foi a Confraternização. Cada participante oferecia algo para confraternizar com o grupo.

Resultados

Antes do período da pandemia, os resultados desta metodologia de práticas restaurativas surgiam a partir de vários encontros, como: nas acolhidas (figura 1), em reuniões com os pais e responsáveis (figura 2), nos assessoramentos pedagógicos com professores (figura 3), como em salas de aulas com alunos (figura 4).

Nas reuniões de preparos e avaliações de ações envolvendo princípios e valores restaurativos realizadas com o corpo docente, as dificuldades e aceitações da proposta de práticas restaurativas eram as mais polêmicas, visto que a mudança de comportamento era um critério utilizado pelo processo com Círculos e também podia ser um obstáculo para alguns professores trabalharem o afeto e os sentimentos, uma vez que atenções e intenções eram os repasses dos conteúdos de suas disciplinas. Relutavam em não querer mudança de postura na metodologia de trabalho, na valorização do aluno como indivíduo capaz de construir o seu próprio conhecimento.

Trabalhar as emoções era algo que fugia da rotina de trabalho, sendo mais cômodo que os conflitos fossem solucionados de forma punitiva e imediata, e não através do diálogo entre as partes afetadas onde tinham a oportunidade de exporem suas versões dos fatos e sentimentos e possibilitando chegar a um acordo que fossem satisfatórios a todos. Entendia-se que o novo assustava naquele momento pelo fato de que a maioria dos professores não tinham o hábito de resolver conflitos por meio do diálogo.

Tais questões, fizeram a Escola Ribamar Pestana repensar suas ações para torná-la mais afetuosa, alegre, com convivência harmoniosa buscando sua significância para a comunidade, requerendo um trabalho coletivo entre todos os que integravam o espaço. No dizer de Pranis (2015), construir uma comunidade escolar restaurativa. Para Freire (1991), pensar a escola como espaço democrático, de debate, de discussão, de compreensão na perspectiva de participação coletiva e não mais para repreender, punir ou oprimir. Assinalando que:

IMG-20180811-WA0051Não devemos chamar o povo à escola para receber instruções, postulados, receitas, ameaças, repreensões e punições, mas para participar coletivamente da construção de um saber, que vai além do saber de pura experiência feito, que leve em conta as suas necessidades e o torne instrumento de luta, possibilitando-lhe transformar-se em sujeito de sua própria história. (Freire, 1991, p. 16).

Com o estabelecimento das práticas restaurativas com processos circulares, a mudança de postura, de ressignificar conteúdos e valores se tornava necessário para a alegria da escola. Pranis (2015, p. 23) complementa, dizendo, (...)” O Círculo preenche a função comunitária básica: mantém um equilíbrio saudável entre as necessidades individuais e as necessidades do grupo”.

No que se refere as experiências da aplicabilidade da metodologia das práticas restaurativas no contexto escolar, no período da pandemia, foram adequadas para o momento delicado que todos passavam, visando a comunicação e a interação dos professores e dos alunos com a escola. Os diálogos educativos, feitos por meios tecnológicos, estarão guardados em cada um que participou. Foram construções de relacionamentos que priorizaram o bem-estar com o outro e consigo mesmo, foram exposições de sentimentos delicados que ficarão presentes na memória dos atores, onde um se permitiu ouvir e ser ouvido por meio da compreensão e da conexão que cada momento proporcionou no período criado e estabelecido pela pandemia.

Algumas dessas práticas metodológicas restaurativas fizeram parte da composição do planejamento escolar realizado por meio virtual. Práticas essas, como as Rodas de Conversas com os professores, pensando como poderiam estar conciliando o trabalho, a vida privada e refletindo o que aprenderam com a pandemia (Figuras 5 e 6).

O que levou a dizer que, os Círculos foram uma metáfora para manter viva a postura restaurativa no coração, na mente e nos sonhos dos que participaram deles, objetivando dar força e coragem para encarar a atroz realidade daqueles meses.

A realização de cada Círculo foi planejada com muito cuidado e carinho desde a confecção dos convites até a sua finalização (Figuras 7 e 8). Foram longas trocas de conversas sobre a aplicabilidade da metodologia, um ir e vir de ideias até a definição final. Como diria Maturana (1991).

Para a equipe do Núcleo de Práticas Restaurativas, organizar com atenção e cuidado o que cada Roteiro de Círculo causaria (Figuras 9, 10, 11 e 12), alinhando ações com intenções e depois participar da aplicabilidade por meio virtual, foi colher resultados positivos, foi confirmar que as pessoas poderiam estar conectadas mesmo distantes uma das outras, foi proporcionar a descontração, a leveza, a alegria e satisfação percebida em cada rosto de professor e professora quando se encerrava um Círculo.

Percebeu-se, nesse contexto pandêmico, situações seguidas de suas consequências, fazendo-se necessário, encaminhar à direção da escola e as equipes do Núcleo de Práticas Restaurativas contatos de alunos que estavam vivendo em situação de vulnerabilidade social, perdas de entes queridos e mudança do cotidiano de suas famílias e precisando de atenção ao emocional, para que pudessem novamente se sentir vivos e parte da escola e na escola.

Foram organizadas busca ativa e escuta com os responsáveis de alunos que estavam afastados da escola, e acolhimentos dos mesmos na volta às aulas sem prejuízo em seus processos de escolarização. Foram ainda, realizados atendimentos a estudantes com tentativas de suicídios, de depressão e de dores e tristezas provocadas pela situação vivida por conta da pandemia.

As mudanças positivas foram percebidas quando estudantes expressavam por meio da escuta alguma confiança, troca, atenção de reconhecimento das próprias necessidades.

A percepção por parte dos professores, acerca dos alunos precisando de apoio, foi resultado das experiências, reflexões e aprendizados ao uso das metodologias das práticas restaurativas, ficando evidente nesse depoimento de uma professora:

Ao realizar o Círculo de Diálogo em uma aula virtual com minha turma utilizei a canção Acredite em Você, de Isadora Pompéu. Em seguida, pedi aos alunos que após ouvi-la fizessem comentários a respeito e uma aluna disse o seguinte: a música era linda e que mexia muito com ela, pois sua família não lhe apoiava e nem a incentivava a estudar, sempre que falava em querer ter uma profissão seu pai dizia para ela esquecer e tirar essa ideia da cabeça, pois nunca ia conseguir realizar esse desejo, isso era apenas um sonho. O momento mais emocionante foi ver os demais alunos dando apoio, estimulando com mensagens positivas e de esperança para a aluna (Narrativa de uma professora).

Muitas vezes, a escola foi o único espaço de interação, de relação, de socialização que a grande maioria dos alunos tiveram no ensino remoto. E na declaração acima, a professora foi essa “ponte” quando escutou, ouviu e deu atenção a aluna, havendo um incentivo para os estudos. Foi um meio de oferecer um ambiente restaurativo e saudável com boa afinidade entre todos.

Os resultados referentes ao nível de relacionamento entre professores e estudantes no período analisado, demonstraram que foram positivos, pois além de ensinarem, os professores ouviram, acolheram e dialogaram com os alunos, incentivando a manterem um bom relacionamento com suas famílias.

Percebeu-se, o quanto o corpo docente ajudou seus alunos mesmo à distância, mantendo a comunicação durante os minutos de aulas, momentos esses, preciosos para a interação, o relacionamento e de socialização para eles.

Identificou-se com clareza que o trabalho das Práticas Restaurativas se caracterizou como atividade/ação, teórico-prático, reflexivo-ativo, tendo o processo de construção e reconstrução das metodologias restaurativas adaptadas para o formato virtual, nutrindo relacionamentos saudáveis em professores e em estudantes no momento vivido de isolamento.

Comentários

A pandemia do novo Coronavírus exibiu um cenário de isolamento social com número cada vez mais crescente de mortes em todo o mundo, fez parecer que era cada vez mais difícil voltar a ser o que foi antes.

Tratando do cenário onde foi realizado este estudo, pode-se descreve-lo como parecido a tantas outras escolas. Entretanto, seu destaque está nas lutas vivenciadas em sua história para fazer desta, um espaço onde a comunidade escolar pudesse sentir-se parte de suas conquistas. Foi exatamente isso que ocorreu quando as Práticas Restaurativas foram implantadas nesse ambiente. A apropriação da proposta por todos foi a forma de fazer a diferença mostrada no contexto da pandemia.

Os desafios foram muitos, e dentre esses desafios o pouco tempo que todos tiveram para se habituarem com os instrumentos tecnológicos como recursos para as aulas. Essa nova prática provocou grandes mudanças na rotina da escola, de um lado professores sem formação específica para lidar com ferramentas tecnológicas e de outro, alunos sem maturidade para estudar remotamente.

Visualizou-se que os atores elencados neste estudo, os professores como os alunos precisavam de tempo na (re)construção de novas rotinas de vida, de suas emoções e sentimentos que o processo gerou. (Re)inventar a profissão docente não foi fácil, (re)inventar os modos de vida em situação de distanciamento social, foi mais difícil e doloroso. Mas este estudo mostrou uma forma que a escola buscou contribuir no cultivar da alegria de estar nela e conservar nesse espaço a comunicação, a integração, a troca de saberes, mesmo que de forma remota, tornando privilegiada e adequada para a aplicação da metodologia de práticas restaurativas.

Ao se pesquisar as Práticas Restaurativas no contexto da pandemia do Coronavírus, o estudo revelou como base três autores que convergem no mesmo sentido quando o assunto é construir um clima escolar positivo onde todos sintam-se bem e pertencentes, sendo Hopkins, Pranis e Freire. Diante disso, surgiu o interesse de expor as convergências mais evidentes e simples encontrados entre eles, pela relação com a escola.

Cabe evidenciar que não se pretendeu fazer comparações entre os autores, sem ter realizado um aprofundamento nos estudos das obras de cada um deles, a fim de verificar onde um é mais assertivo em suas colocações que os outros. A relação entre os autores é na forma de aproximações com a escola, extraídas a partir da análise de suas profundas experiências no campo educacional.

Examinando as aproximações entre os três autores em torno do objeto comum investigado – o Contexto Escolar, identificou-se que os três têm o mesmo desejo em querer a justiça e uma cultura de paz, tendo como principais elementos os princípios restaurativos, valores e habilidades como bases para a construção de uma sociedade mais justa, mais igualitária e mais humana. Os três autores, oferecem um rico embasamento teórico-prático em suas obras, oferecendo suas aplicações às mais diversas situações do cotidiano escolar. Tendo as autoras, Hopkins e Pranis apresentando seus estudos com a metodologia de processos circulares como ferramenta aos princípios restaurativos para proporcionar à escola um ambiente de aprendizagem e de prevenção e superação de conflitos e violências.

Nos estudos de Freire, a alegria e esperança sempre eram ressaltadas. Sua trajetória de vida embasou suas teorias dialeticamente, propondo constantes releituras e interpretações da realidade da escola e sua real função. Desejava ver a união da humanidade na busca da justiça e da paz. Nesse viés, pode ser percebido que as ações executadas pela escola convergem aos pensamentos dos autores que serviram de base para este estudo, quanto propõem o desafio para construir uma escola positiva por meio do diálogo e das relações estabelecidas entre todos. Onde todo o saber e conhecimento são vistos por uma sabedoria própria, onde cada pessoa não tem menos ou mais, nem saber diferente.

Freire, critica a educação bancária, centrada no professor e em sua necessidade de transmitir conteúdos, sendo preciso que o professor repense seu papel de educador, em vez de lógicas disciplinantes, que se promova o diálogo e a construção coletiva. Sendo o professor, o responsável pelas mudanças em seus alunos, redefinindo assim, um outro perfil profissional na relação estabelecida, pois ambos passam a ser parceiros, orientadores da busca e compreensão de novas ideias e valores nessa aprendizagem, assumindo equívocos e acertos, tendo a consciência de que a prática se transforma à medida que aceitam o desafio de compreender e desvelar sua conflituosa relação.

A seriedade não precisa ser pesada. Quanto mais leve é a seriedade, mais eficaz e convincente é ela. Sonhamos com uma escola que, que porque séria, se dedique ao ensino de forma competente, mas dedicada, séria e competentemente ao ensino, seja uma escola geradora de alegria. O que há de sério, até de penoso, de trabalhoso, nos processos de ensinar, de aprender, de conhecer não transforma este que-fazer em algo triste. Pelo contrário, a alegria se ensinar- aprender deve acompanhar professores e alunos em suas buscas constantes (Freire, 2004, p. 171).

É necessário questionar os métodos de ensino que ano após ano continuam sendo repassados em sala de aula e já se tornaram obsoletos na aprendizagem dos alunos.

Para Freire, a forma ríspida como alguns professores impõem sua autoridade pode influenciar os alunos a serem revoltados, e isto pode gerar comportamentos displicentes e até mesmo atos conflitantes em sala de aula. É essencial que haja uma boa relação entre os pares, para compreenderem quais conhecimentos significam para eles. Freire, frisa que, “ninguém educa ninguém”, “o diálogo começa na busca do conteúdo programático”, pensamentos profundos que colocam em debate a temática da autoridade daquele que educa.

O professor é desafiado a pensar sobre sua autoridade, acerca do exercício de poder, ao uso da força, a capacidade de guiar os outros, os modos de disciplinar ou a capacidade superior de julgar. A autoridade é um processo que se traduz no modo como ela é praticada em sala de aula, onde os alunos reagem aderindo ou rejeitando por meios de seus comportamentos demonstrados ao professor.

Nesse viés, foram observados pelos resultados, que foi no contexto da pandemia que os desafios foram enfrentados, e muitos vencidos, porém o medo e traumas ultrapassaram os limites impostos a natureza do ser humano requerendo perceber habilidades desconhecidas por muitos.

Observou-se o quanto foi necessário o apoio e atenção aos professores e aos alunos. Sendo imprescindível mudanças ao que já não fazem mais sentido para o que foi ontem. É indispensável, pensar de que forma a escola influenciou ou desmotivou os professores e alunos a buscar possibilidades de aprender, reinventar e superar os medos e traumas sentidos e vivenciados e que farão sentido para a vida daqui para a frente.

Neste mesmo contexto, outro aspecto desafiador vivenciado foi o professor se adaptando, se reinventando e se superando aos meios tecnológicos, como também buscando planejamentos de suas aulas a partir de cada realidade de seus alunos, muito embora esse retorno não fosse como planejado, mas ser educador é ser mais que professor, é viver em constante construção, reflexão e preparo. Freire (2002) caracteriza o professor como transformador que acredita em si e também em seus alunos.

Cabe retomar as primeiras observações, no sentido de que em nenhum momento deste estudo se fez pensar que os vários desafios acarretados pela pandemia não fizeram sentidos e não existiram. O que se objetivou foi apresentar o modo como a escola desenvolveu um trabalho de apoio aos professores e alunos por meios de práticas restaurativas. Percebeu-se, por meios dos resultados uma escola comprometida com a organização em seus objetivos e cuidadosa com todos e, ao mesmo tempo, propondo promover a alegria em seu interior.

Os resultados mostraram que essa possibilidade está contida nas ações desenvolvidas antes e durante a pandemia. Certos de que se devam principalmente ao desempenho dos trabalhos administrativo e pedagógico, articulados com a equipe do Núcleo de Práticas Restaurativas para que esse esforço seja uma constância no aprendizado coletivo e no crescimento de seus atores - professores e alunos.

Por sua vez, é preciso enfatizar que a metodologia das práticas restaurativas também passou por adaptações no contexto do ensino remoto, isso mostrou que a proposta de querer o bem-estar entre todos não existia só presencialmente, dentro de uma estrutura concreta de escola, mas também se manteve de forma virtual e a distância.

Percebeu-se, nas experiências de Círculos realizados de forma virtual, a conexão, o vivenciar, o respeito e a escuta de cada um pelo outro. Os professores mostraram segurança ao falar do que estavam sentindo e vivendo em suas vidas. Isso os tornavam mais próximos e solidários uns com os outros. Assim, foram compartilhados dores, sentimentos, sabedorias e aprendizagens a partir de suas histórias de vida em momento pandêmico.

Pranis (2015), chama isso de Cultura da Cooperação, quando há aspectos de unidade, poder compartilhado, criatividade e colaboração. No dizer da autora (2015, p. 23), “no Círculo, ninguém é mais importante ou tem mais direitos ou mais poder do que qualquer outra pessoa participante. Mesmo que alguém não escolha não falar, ninguém é invisível”. Segundo esta autora, “o Círculo acolhe emoções e realidades difíceis, ao mesmo tempo em que mantém um sentido de possibilidades positivas” (2015. p. 27). Percebeu-se assim, que o Círculo é uma construção coletiva onde cada participante traz sua contribuição de fala para o grupo, com a precisão de ouvir e serem ouvidos, onde ninguém é o dono da verdade e sim, iguais.

Os resultados dessa nova metodologia são vistos positivamente a partir das ações realizadas tanto de forma presencial, antes da pandemia, como de forma remota, quer nas reuniões administrativas e pedagógicas, nos assessoramentos pedagógicos, nas reuniões bimestrais com os pais, no atendimento individualizado com alunos, com turmas de alunos exercitando a empatia e a escuta ativa entre todos.

Pontua-se aqui, que um dos procedimentos restaurativos de Conversa Restaurativa, usados antes, quando professores ou alunos procuravam a equipe de Práticas Restaurativas para relatar algo observado relacionado a conflitos, comportamentos agressivos na sala de aula eram fácies de conduzir por serem atos “visíveis”. Com a pandemia, essa prática continuou sendo feita por intermédio de aparelho telefônico e via redes sociais. Registrou-se a dificuldade de ser construída em decorrência do isolamento e porque pouco ou quase nada se sabia da rotina diária dos alunos.

Ressalta-se que o momento de escuta teve várias quebras de sequências em decorrência de ausência de respostas, onde a postura do interlocutor era apenas compreender a necessidade do outro. Entretanto, a utilização dessa prática possibilitou auxiliar vários alunos que estavam vivendo impactos em consequência da pandemia e que, do outro lado, tinha alguém que se preocupava com eles.

Um dos momentos significativos vivenciados nesse estudo, foi interpretar os resultados da postura dos professores diante de traumas e perdas sofridas por estudantes que precisaram de acolhimento, paciência e empatia para seguirem em frente. É preciso enfatizar que a escola terá um longo período pela frente, no qual precisará trabalhar o emocional dos alunos e cuidar de seus professores. Os desafios serão muitos.

Essas e outras questões devem alimentar novamente o momento de ação-reflexão-ação a ser estabelecido no planejamento do Núcleo de Práticas Restaurativas para 2022, com a perspectiva de superação dos danos emocionais provocados pelo período pandêmico.

Dando apoio ao professor na comunicação com os alunos, para saber ouvir e saber como pode ajudar a resolver uma situação de forma justa e coerente em sala de aula, ou caso não seja de sua competência procurar auxílio, mas não a ignorar.

Os resultados dessa nova leitura de contexto se darão a longo prazo, sendo necessário que a escola faça uma reflexão significativa do seu papel de educadora, fazendo valer sua função e espaço, onde a grande maioria os estudantes só tem esse lugar de interação, de relação, de socialização, sendo preciso portanto, que a sala de aula ofereça um ambiente saudável sendo o professor, o responsável na relação estabelecida com o aluno, pois ambos passam a ser parceiros, orientadores da busca e compreensão de novas ideias e valores nessa aprendizagem, assumindo equívocos e acertos, tendo a consciência de que a prática se transforma à medida que aceita o desafio de compreender e desvelar a conflituosa relação.

Certamente, a conclusão a que se chega é que, se a Educação não conseguir promover a construção do conhecimento por meio do afeto, do respeito, das diferenças, das dificuldades e dos sentimentos do aluno, não será por meio do autoritarismo e do castigo que formará cidadãos coerentes.

Afora a consideração do aspecto acima referido, coube informar que no momento de finalização deste estudo, a escola já havia retornado suas atividades por meio do ensino hibrido e contou com o apoio da equipe de Práticas Restaurativas apresentando como proposta para o primeiro dia a realização de Círculos de Acolhimentos entre professores a alunos nos três turnos.

O roteiro do Círculo continha as seguintes perguntas restaurativas: - O que tem de novo na escola que faz você se sentir seguro e feliz? – O que você pode fazer por você e por seu colega que o ajudaria a sentir-se feliz e seguro no retorno às aulas presenciais? Objetivando fortalecer o relacionamento entre professores e estudantes e alinhar as ações com as intenções, uma vez que a pandemia ainda não acabou.

Assim, com base nessa experiência, procurou-se apontar fatos, indicar pistas e alternativas que possam estimular outras escolas a utilizarem a metodologia das Práticas Restaurativas, assim como, contribuir para o desenvolvimento de novas pesquisas na área. Diante das constatações obtidas através da pesquisa e análise deste trabalho, faz-se necessário superar a linguagem da crítica pessimista, pensando outras possibilidades de ver a alegria na escola.

Finalizou-se este estudo com o prefácio do livro “Alunos Felizes” de Georges Snyders, escrito por Paulo Freire e publicado em 1993:

Este é, sem dúvida, um livro profundamente atual. Um livro que ultrapassa certo ranço tradicionalista em que a alegria se afogava envergonhada de si mesma, contida, para não virar pecado, que supera certo cientificismo arrogante da modernidade e grita, mesmo discretamente, mas decididamente, ao estilo do autor, em defesa da alegria. A alegria na escola, por que Georges Snyders vem lutando, alegremente, não é só necessária, mas possível. Necessária porque, gerando-se numa alegria maior – a alegria de viver –, a alegria na escola fortalece e estimula a alegria de viver. Se o tempo na escola é um tempo de enfado em que educador e educadora e educandos vivem os segundos, os minutos, os quartos de hora à espera de que a monotonia termine a fim de que partam risonhos para a vida lá fora, a tristeza da escola termina por deteriorar a alegria de viver. É necessária ainda porque viver plenamente a alegria na escola significa mudá-la, significa lutar para incrementar, melhorar, aprofundar a mudança. Para tentar essa reviravolta indispensável é preciso deixar bem longe de nós a distorção mecanicista; é necessário encarnar um pensar dinâmico, dialético. O tempo que levamos dizendo que para haver alegria na escola é preciso primeiro mudar radicalmente o mundo é o tempo que perdemos para começar a inventar e a viver a alegria. Além do mais, lutar pela alegria na escola é uma forma de lutar pela mudança do mundo. (Snyders, 1993, p. 9)


 Referências  

Freire, P. (1991). A Educação na Cidade. Cortez.

Freire, P. (2002). Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 25ª ed. São Paulo. Paz e Terra.

Freire, P. (2004). Pedagogia da Tolerância. Organização e notas Ana Maria Araújo Freire. Editora São Paulo.

Hopkins. B. (2004). Just Schools: A Whole School Appproach to Restorative Justice. Jessica Kingsley.

Maturana, H. (1991). El sentido de lo humano. 9a. Ed. Santiago de Chile: Dolmen Ediciones.

Pranis, K, Watson, C. (2015). Manual de Círculos em Movimentos – Construindo Uma Comunidade Escolar Restaurativa. Tradução de Fátima de Bastiani. Porto Alegre: AJURIS e Terre des Hommes Lausanne.

Scuro Neto, P. (1999). Manual de sociologia geral e jurídica: lógica e método do direito, problemas sociais, comportamento criminoso, controle social. Saraiva.

Snyders, G. (1993). Alunos felizes: Reflexão sobre a alegria na escola a partir de textos literários. Rio de Janeiro: Paz e Terra.


[1] Escuta ativa é o processo através do qual se deixa a outra pessoa saber que você estava prestando atenção e se interessando pelos pensamentos e opiniões dela. Disponível em http://www.pgj.ce.gov.br/nespeciais/nucleomed/pdf/NMC_informe_43.pdf. Acesso 16/09/2021.